BnR. Transição do ensino fundamental I para o II exige atenção redobrada dos pais

Adaptação à rotina escolar deve começar com uma semana de antecedência


Com a proximidade do fim das férias é preciso começar a pensar em como preparar crianças e adolescentes para se adaptar novamente ao dia a dia na sala de aula


Voltar ao ritmo das aulas após mais de um mês de férias não é uma tarefa fácil para os estudantes. É necessário alguns dias de adaptação para que eles se acostumem novamente com o horário de acordar retomem o foco para os estudos. Especialistas afirmam que os adolescentes são os que mais enfrentam dificuldade nesse período e que, por isso, precisam de tanta atenção dos pais quanto as crianças. 

A diferença de comportamento de crianças e adolescentes na sala de aula é nítida. O menores tendem a ser mais curiosos, a fazerem mais perguntas em sala e se apegam mais aos materiais escolares. Por isso, fica mais fácil envolvê-los no processo de volta às aulas com a personalização de cadernos e a organização de estojos e de mochilas, por exemplo. 

O papel de acostumar o aluno com as rotinas da escola vai além da instituição de ensino. Pamela Cristine da Silva, 25 anos, é mãe de Victor Hugo Costa, 6, que ingressará a no ensino fundamental, em uma escola pública no Jardim Botânico. Desde os dois anos de idade ele foi matriculado no maternal e agora, no período de férias, a mãe mantém a rotina do estudante de acordar cedo para que ele não perca o hábito. 

"Eu não deixo ele dormir até tarde, mesmo nas férias, já pensando no período das aulas. Ele não tem videogame, para não ficar acordado até tarde, e geralmente só brinca aqui na rua mesmo", relata Pamela. "Ele é um garoto muito bom e que se adaptou bem na escola. Quando o coloquei no maternal a adaptação foi rápida. Ele gosta bastante dos coleguinhas, do material escolar. Estou tentando colocar ele em uma escola aqui perto de casa, para ficar mais fácil e onde o primo dele já estuda, mas até agora não consegui vaga", completa.
Pamela mantém a rotina do pequeno Victor Hugo mesmo durante as férias, para que ele não tenha problemas na hora de se adaptar ao cotidiano escolar | Foto: Ana Rayssa/Esp. CB/D.A. Press
A psicóloga Ana da Costa Polonia, professora do curso de psicologia da Unieuro, estuda as relações entre a escola e a família. Ela destaca que a preparação para voltar ao ritmo normal das aulas deve começar uma semana antes do início do ano letivo. "Uma coisa importante é apontar para a criança que as férias foram somente um período de descanso e destacar que a rotina normal vai reiniciar. Deve-se lembrar para o estudante mais pequeno o que se fazia antes das férias. Lembrar quando eles acordavam", explica. "Uma boa estratégia é chamar a criança para fazer um calendário de rotinas. Pode-se usar uma cartolina ou colar avisos com os horários na parede", destaca a especialista. 

A professora destaca que é importante tomar algumas medidas antes da volta às aulas para evitar que os estudantes tenham problemas nos primeiros dias. "Uma ação importante nessa semana que antecede a volta do período letivo é fazer com que a criança durma mais cedo. Não deixar que fique até tarde na televisão", ressalta. 

Ela lembra ainda que a alimentação não pode ser deixada de lado nesse período de preparação. "Os pais devem explicar que agora vão existir horários para as refeições, que o sorvete e outros alimentos que a criança gosta só serão consumidos agora no fim de semana. Com isso, as crianças vão se adaptar muito melhor e não terão dificuldades de aprendizado", afirma.
Uma coisa importante é apontar para a criança que as férias foram somente um período de descanso e destacar que a rotina normal vai reiniciar"
Ana da Costa Polonia, psicóloga
Com o início das aulas, o desafio de prender a atenção dos estudantes é repassado aos professores. A atenção e apoio que os alunos têm nas primeiras séries do ensino fundamental são cruciais para definir como eles vão evoluir ao longo das séries seguintes e a vontade que os discentes terão de aprender. A professora Angela Macedo, 43 anos, dá aulas para estudantes do 1º ao 4º ano, no Centro de Ensino Fundamental Nossa Senhora de Fátima, em Planaltina. A professora destaca que é perceptível a diferença no comportamento dos estudantes quando eles chegam das férias para os demais dias do ano. 

Segundo ela, é importante ter ferramentas pedagógicas para chamar a atenção dos pequenos durante a rotina escolar. "As crianças chegam mais dispersas nos primeiros dias após as férias. Temos que retomar o aprendizado do ano anterior. É preciso criatividade para prender a atenção deles. Geralmente, uso histórias infantis para atrai-las. Podemos usar fantoches e livros com um tom de voz mais agradável", ressalta Angela. 

A pedagoga destaca que as famílias devem estar sempre presentes na vida escolar dos alunos. Assim, a criança se adapta melhor e desenvolve o aprendizado de maneira mais fácil. "Os estudantes menores demonstram mais alegria ao chegar à escola. A preguiça começa a surgir com o avançar dos anos. As crianças passam a conversar mais em sala. O foco de atenção muda com o avançar das séries. Por isso, os pais precisam acompanhar a vida escolar dos filhos", destaca. 


Saiba como ajudar na adaptação do seu filho:
Uma semana de preparo 
A preparação para o retorno das aulas deve começar na semana anterior ao início do ano letivo. Nesse período, os pais devem evitar que os filhos fiquem acordado até tarde, para descansarem e acordarem bem dispostos no dia seguinte.
Calendário e avisos
Com os filhos, os familiares devem confeccionar avisos e um calendário de rotinas. O material deve ser fixado nas paredes do quarto do estudante ou em um mural confeccionado para este fim. Pode-se usar cartolina, papel e outros materiais. Os avisos não devem ser colocados em meios eletrônicos.
Alimentação definida
Na semana de preparação, os estudantes já devem voltar à rotina normal de alimentação. Com hora definida para café da manhã, almoço e jantar. Também devem ser cortados doces, sorvetes e salgados durante as refeições. Esses alimentos devem ser restritos ao fim de semana, a fim de que o jovem não se acostume a comer esses itens na sala de aula.
Material organizado 
O material escolar deve ser revisado e organizado na companhia da criança. É preciso conversar com o estudante sobre a importância de ter os itens a serem levados para a aula organizados, mostrar para que serve cada um e como tudo deve ser arrumado na mochila antes e depois das aulas.
Uniforme arrumado
Os especialistas recomendam que exista um lugar no quarto para guardar o uniforme escolar. Pode ser uma caixa em cima de uma cadeira ou um espaço no guarda-roupas. Assim, a criança e o adolescente vão saber onde colocar o uniforme quando chegar da escola. Isso incentiva a organização e o planejamento dos estudantes.
Independência
Quando o estudante, seja criança ou adolescente, realizar atividades relacionadas à rotina escolar, ressalte que ele está mais independente. Frases de apoio, demonstrando reconhecimento e orgulho incentivam os estudantes a serem protagonistas das próprias rotinas e terem consciência das responsabilidades. 


Fontes: Alba Lúcia Pezam, professora de psicologia do Iesb; e Ana da Costa Polonia

Período mais complicado para adolescentes

Apesar de estarem mais ansiosos para a volta das aulas, momento de retomarem o contato com o ciclo de amizades, os estudantes com idades acima de 12 anos levam mais tempo para voltar a acordar cedo e se desapegarem da rotina de férias, segundo especialista. Isso ocorre principalmente porque os adolescentes precisam de mais horas de sono e de descanso do que as crianças. "O adolescente tem um perfil diferente e exige uma rotina mais pessoal. Com eles se deve ter uma conversa mais pessoal sobre a importância da escola. Os pais precisam destacar que ser independente é importante para eles. Geralmente após duas semanas de férias eles já estão entediados, querendo voltar para a escola. Mas essa volta deve ser feita de forma tranquila, sem pressão", destaca a psicologa Ana Polonia. 

O Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos (CDC) apontou que os adolescentes deveriam entrar na escola por volta das 8h30. No Brasil, um estudo realizado pelo Instituto de Pesquisa e Orientação da Mente em parceria com o Instituto Sou +Jovem mostrou que 43% dos jovens com idades entre 14 e 18 anos dormem de três a cinco horas por noite, levantando geralmente às 6h para irem à escola. Nas férias escolares, as horas de sono aumentam e o corpo se acostuma com o descanso prolongado. 

Ao voltar à rotina normal, de levantar cedo, o estudante pode ter um baixo rendimento escolar, dificuldade de concentração e para fixar o conteúdo apresentado em sala. Segundo o estudo, se adaptar à mudança pode levar várias semanas. 



Leia mais na quarta-feira (18/1), no caderno de Cidades: como preparar as crianças para a primeira vez na escola

Segundo ciclo do ensino fundamental é marcado por mudanças

Entre elas estão o aumento no número de professores e, em alguns casos, a mudança do turno de vespertino para matutino. Especialistas dão dicas para o momento de transição

Fernando Caixeta
Especial para o Correio
Muitas mudanças esperam os alunos que terminaram o 5º ano do ensino fundamental em 2016 e vão começar o 6º em 2017. A "tia", que ensinava praticamente todas as disciplinas, sai de cena. Os estudantes que passarem pela transição do primeiro para o segundo ciclo desta etapa do ensino terão professores diferentes para cada matéria. Isso significa mais responsabilidade e mais deveres de casa. 

Essa nova etapa pode exigir outras adaptações, que não dizem respeito apenas ao conteúdo. Muitas escolas separam as crianças que entram nos anos finais do ensino fundamental dos estudantes mais novos. A separação pode ser física, com setores diferentes da escola para cada faixa de ensino, ou em turnos diferentes para cada ciclo. Nesses casos, estudantes que estavam acostumados a começar as aulas à tarde passarão a entrar no começo da manhã, o que deve exigir alguns dias de adaptação para a nova rotina. 

É o caso de Theo Oliveira, 11 anos, que terminou o 5º ano em 2016 e agora, no 6º, terá uma rotina diferente da que levava até então. Theo estudava à tarde no ano passado e, neste ano, terá de estar uniformizado, na porta da escola, às 7h30. O horário de saída é perto das 13h. "Vou sair da aula morrendo de fome. Lá no meu colégio, a lanchonete fica perto das salas, então quando eles estão cozinhando alguma coisa lá, entra aquele cheirinho bom de comida, que a nossa barriga fica até roncando", brinca. 

A mãe de Theo, Cristina Oliveira, diz que a mudança vai alterar a rotina da família. "Eu estou na expectativa, vai ser uma novidade para todo mundo. Além de mudar de turno, a carga horária vai aumentar. Ele vai ter mais professores, o que significa mais dever de casa. Também vai precisar se adaptar ao novo horário e a logística de levá-lo à escola e buscá-lo também muda", afirma Cristina.
Theo, filho de Cristina, vai entrar para o segundo ciclo do ensino fundamental este ano e já se preparar para as mudanças | Foto: Ana Rayssa/Esp. CB/D.A. Press
Para Walmir Cardoso, doutor em educação matemática e coordenador da Roquette Pinto, empresa de comunicação educativa, essa é uma passagem que implica num número expressivo de mudanças. "Os estudantes deixam de ter um professor único em sala de aula e passam a conviver com estilos diversificados de quase uma dezena de docentes diferentes", explica. 

Além disso, ele detalha que os tempos são marcados pelas durações determinadas das aulas em cada disciplina, com o decorrente aprofundamento de conteúdo, níveis de exigência e ampliação significativa no volume de tarefas para casa. "Soma-se a isso o fato de muitos estudantes deixarem a rede municipal e passarem à rede estadual, o que implica em mudança de escola. Para completar o quadro de complexidade dessas mudanças, os estudantes estão entrando na adolescência", completa Cardoso. 

De acordo com o psicólogo escolar Erich Botelho, o impacto causado pela entrada na segunda etapa do ensino fundamental é menos intenso do que o causado no acesso ao ensino médio. Em qualquer caso, no entanto, a família tem que ajudar na adaptação. 

Algumas crianças chegam a essa nova etapa sem o devido domínio de alguns conteúdos que foram ensinados. O psicólogo defende que, nesses casos o atendimento deve ser individual e personalizado para cada criança. "Mesmo entre crianças da mesma faixa etária, com os mesmos professores, aprendendo a mesma matéria, podem ter aquelas que compreenderam e aquelas que não entenderam a matéria. Mesmo nessas condições em que tudo é igual, são indivíduos diferentes. O grande desafio da escola é saber identificar isso", analisa Botelho.

O estudante Theo Oliveira, filho de Cristina, já está ciente de que 2017 vai ser um ano com muito dever de casa. "Esse ano eu vou ter bem mais professores, pela primeira vez, vou ter professor homem e uma matéria nova: espanhol. Acho que vai ser muito legal aprender esse idioma", diz. 

Apesar de tanta mudança, Theo aguarda o começo das aulas com ansiedade e expectativa. "Eu sei que vai ter muita coisa nova, mas fiquei feliz em passar para o 6º ano e acho que não vou ter problema para me acostumar', afirma. 

Na avaliação de Walmir Cardoso, não existe uma quantidade padrão de lição de casa que deve ser feita pelo estudante, mas a tendência é que aumente quanto mais professores entrarem em cena, como ocorre a partir do 6º ano. Para o doutor em educação, se o tempo de dedicação para a lição começa a exceder, sistematicamente, duas horas por dia, outras atividades igualmente importantes podem ficar comprometidas. 

"Com a lição de casa, o professor avalia o desempenho individual e coletivo dos estudantes. Ela serve para sistematizar conhecimentos, pode ser usada como elemento preparatório de novas atividades e também funciona para aprofundar temáticas desenvolvidas", diz o especialista. Segundo ele, o ócio também é essencial na vida do estudante. 

Ao completar a primeira metade do ensino fundamental, o aluno deve dominar alguns conteúdos para conseguir acompanhar o ritmo a partir do 6º ano. "Creio que mais do que uma lista de conteúdos a preocupação deve ser o processo para se chegar até esse estágio de complexidade. Por exemplo, uma expectativa em língua portuguesa no fim do 5º ano é que o estudante possa revisar textos, próprios e dos outros, em parceria com colegas, com intenção de evitar repetições, ambiguidades e erros ortográficos e gramaticais", detalha. 

"Para ele atingir essa etapa de desenvolvimento entre suas competências leitoras, é necessário que, em anos anteriores, ele reescreva histórias conhecidas, ditando-as e, em outra etapa, revise textos coletivamente com a ajuda do professor, prestando atenção aos aspectos de coerência, coesão e ortografia."
Confira as dicas de especialistas para a mudança de ciclos: 

- Deixar claro para a criança que ela terá mais responsabilidades a partir de agora; 
- Estabelecer horários fixos para fazer a lição de casa; 
- Reservar um tempo para as atividades físicas e brincadeiras; 
- Auxiliar a criança na lição de casa, o que não significa fazê-la para ela; 
- Indicar fontes de pesquisa e supervisionar resultados da criança. 



Leia mais na quinta-feira (19/1), no caderno de Cidades: como preparar crianças e adolescentes para mudança de colégio

Família e escola têm responsabilidade conjunta na formação do estudante

Formação escolar ajuda a desenvolver aspectos essenciais, como a responsabilidade e o respeito às diferenças, mas é importante que os pais dialoguem com a instituição de ensino para contribuir no processo

Fernando Caixeta
Especial para o Correio
Bruna Corrêa com os filhos Sophia, Bruno, Bento e Davi. Em casa, ela tenta mostrá-los diversos pontos de vista sobre todos os temas | Foto: Minervino Júnior/CB/D.A. Press
Quando se fala em educação dos filhos não existe uma divisão brusca entre o que é de responsabilidade da escola e o que deve ser ensinado em casa. Profissionais de educação e psicólogos especializados em comportamento escolar afirmam que família e instituições de ensino devem trabalhar de forma integrada, pois ambas têm papel essencial na formação da personalidade de crianças e adolescentes. 

A própria Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), promulgada em 1996 e atualizada praticamente todos os anos, prevê uma educação integrada, que não deve ser restrita somente ao que o aluno aprende na escola. A lei prevê "a liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o pensamento, a arte e o saber". No texto, também consta o pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas, a valorização da experiência extra-escolar e a vinculação entre a educação escolar, o trabalho e as práticas sociais. 

A empresária Bruna Corrêa, mãe de Davi, 14 anos, Sophia, 13, Bruno, 6 e Bento, 3 anos, acredita que a responsabilidade da escola é fornecer o conteúdo pedagógico e o acompanhamento individual do estudante, informando, sempre, a situação escolar da criança aos pais e responsáveis. Bruna faz questão de apresentar aos filhos vários pontos de vista diferentes sobre o mesmo assunto. Até nos temas que, às vezes, levantam polêmica entre pais e professores, como ensino religioso e educação sexual, ela transmite às crianças os valores em que a família acredita, de maneira a complementar o que aprenderam na escola. 

"As pessoas têm muita facilidade em delegar responsabilidades. As crianças ficam muito tempo na escola e com outras pessoas, que não os pais, isso faz com que o pai e a mãe acabem só supervisionando ou, às vezes, nem isso", observa Bruna. "Alguns assuntos, é bem mais coerente a família ensinar, embora eu seja da opinião de que a criança precise ter noção de tudo. Eu quero apresentar para os meus filhos várias questões e, claro, que ao lado deles eu tento orientar, mas tenho que dar essa liberdade a eles."
Bruna acompanha de perto a vida escolar dos filhos e dialoga com eles sobre o que têm aprendido na escola. "Não vejo problema de a escola contribuir na educação religiosa e sexual, mas não é papel só da escola. Deixar só a cargo da escola, eu acho que é transferir uma responsabilidade muito grande. De repente, a criança absorve informações e acaba aprendendo valores que não correspondem aos da família", diz. 

Para a psicóloga infantil e especialista em ludoterapia Vanessa Lacombe, cabe à instituição planejar a melhor metodologia e aplicar as ferramentas disponíveis para contribuir para a formação dos alunos, respeitando o ritmo de cada um. Segundo ela, aos pais, cabe acompanhar os estudos, os interesses e o desenvolvimento cognitivo, social e emocional dos filhos. 

"A escola é primeira grande oportunidade de a criança expandir seu mundo social. São muitas oportunidades de crescimento, aprendizado, amadurecimento, enfim, é onde se inicia um novo caminho para a criança. A escola deve funcionar como mediadora do processo de desenvolvimento de seus alunos", explica. Para a psicóloga, família e escola devem estreitar os laços e a comunicação, com o objetivo de dar suporte aos estudantes. Isso pode ocorrer, segundo a especialistas, por meio de reuniões que não tenham como objetivo tratar apenas do desempenho educacional da criança, mas que também que busquem ampliar o olhar de ambas as partes sobre a criança e o desenvolvimento. 

A diretora da Escola Classe 304 Norte, Nara Gomes, concorda com a opinião da psicóloga. Há 28 anos trabalhando com educação, Nara acredita que a escola tem o papel de cuidar da parte cognitiva e, cada vez mais, o currículo vem focando na formação do cidadão. "Se uma criança estuda em tempo integral, ou semi-integral, a escola acaba entrando também na formação do indivíduo, na postura, na questão da higiene pessoal, então o papel de educar acaba ficando muito misturado", afirma. Ela explica que a escola contribui para o desenvolvimento de habilidades e características já na infância que preparam para outras fases da vida. "A questão do compromisso e da responsabilidade, por exemplo, é uma delas. Para ajudar a desenvolver a responsabilidade, a gente passa o dever de casa, mas a criança não dá conta sozinha, aí entra a família. Por isso essa colaboração é tão importante."
Para ajudar a desenvolver a responsabilidade, a gente passa o dever de casa, mas a criança não dá conta sozinha, aí entra a família. Por isso essa colaboração é tão importante"
Nara Gomes, diretora da Escola Classe 304 Norte
Existem aspectos particulares a cada faixa etária e precisam ser observadas com atenção, conforme ressalta a psicóloga Vanessa Lacombe. "Cada indivíduo tem o seu tempo particular de desenvolvimento, não devem ser feitas comparações entre crianças de mesma faixa etária, por exemplo", explica. De acordo com a especialista, a criança aprende mais a partir de atividades sensoriais, que envolvam o corpo e a experiência motora. Já o adolescente tende a buscar referências nos amigos, no grupo social ao qual pertence ou deseja fazer parte. Por isso, segundo Vanessa Lacombe, é fundamental trabalhar as relações em grupo nessa idade. 

O ambiente social da escola faz com que os alunos tenham experiências que contribuam para a aceitação do outro e o respeito aos diferentes pontos de vista, segundo a diretora Nara Gomes. "A experiência que ele tem em casa é uma, quando ele convive com outro colega, a realidade daquele colega é outra, então ele também aprende com aquilo", reforça.

ENTREVISTA | Vanessa Lacombe, psicóloga

Que aspectos da formação escolar estão envolvidos na formação da personalidade e da identidade da criança, do adolescente e do jovem?
O desenvolvimento individual se dá de forma contextualizada social e culturalmente. A escola é o espaço físico, psicológico, social e cultural onde os indivíduos se desenvolvem globalmente, mediados por uma sistemática metodológica em função dos estágios de desenvolvimento. Na medida em que a escola sai do papel restrito de promover exclusivamente a aprendizagem de conteúdo, deve levar em consideração as fases diferenciadas de desenvolvimento, a fim de promover o desenvolvimento dos papéis sociais de seus alunos. Estes, enquanto protagonistas do próprio aprendizado, ampliam o repertório de comportamentos constituintes de sua personalidade, com mais autonomia e independência. Ao ampliar os seus papéis sociais além do ambiente familiar, o indivíduo desenvolve-se cognitiva, social, física e afetivamente. 

Se em uma das instituições (família ou escola), o aluno vai mal, como isso pode afetar o desenvolvimento da criança? 
O aluno reflete em cada um dos seus ambientes o seu interior, que é indivisível. Não é possível "deixar em casa" os problemas familiares e pessoais, bem como não é possível "deixar na escola" os problemas enfrentados lá. Sendo assim, é preciso que tanto os pais quanto os professores fiquem atentos aos seus alunos, observem mudanças de comportamento como isolamento social, distúrbios gástricos (vômitos, dores estomacais, encoprese, diarréias), distúrbios do sono, desejo de não voltar para casa ou de não ir à escola, dificuldade de relacionamento, aumento na agressividade, queda brusca no rendimento escolar, entre outros.
Até bem pouco tempo atrás havia uma clara distinção entre o que deveria ser aprendido nas escolas e em casa, com as famílias. Era papel da escola instruir, passar conteúdo para as crianças. Já às famílias ficava restrito o papel de educar. No entanto, instruir e educar andam juntos, são indivisíveis e não é possível um sem o outro"

E como esses problemas afetam o aprendizado especificamente 
Os problemas emocionais têm influência direta nos processos cognitivos, afetando por exemplo, memória, raciocínio lógico, concentração, dentre outros. Novamente, é a questão de se ter um olhar global sobre um indivíduo. Uma criança que se sente pressionada a ler porque todos os seus amigos já estão lendo, pode desenvolver uma encoprese de fundo emocional, por exemplo. Já um jovem que sofre bullying pode se tornar isolado e ficar o dia trancado no quarto, sem qualquer interação social, por exemplo. Outra criança cujos pais passaram um recente divórcio pode ter uma queda brusca nas notas. E assim, por diante. Nesse caso, cabe a uma das partes comunicar a outra sobre o que está acontecendo em cada um dos ambientes para que, juntas, possam buscar o melhor caminho a fim de ajudar o aluno. 

Existe, de fato, uma separação entre o que a criança deve aprender na escola e o que deve aprender em casa? 
Até bem pouco tempo atrás havia uma clara distinção entre o que deveria ser aprendido nas escolas e em casa, com as famílias. Era papel da escola instruir, passar conteúdo para as crianças. Já às famílias ficava restrito o papel de educar. No entanto, instruir e educar andam juntos, são indivisíveis e não é possível um sem o outro. O ambiente escolar se diferencia dos aprendizados em casa na medida em que atende às necessidades cognitivas, sociais, culturais e psicológicas de forma sistematizada e estruturada. 

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